domingo, 13 de fevereiro de 2011

Porque continuamos atirando neles? - Crônica


Os jogos liberam um lado alternativo do ser humano; mais especificamente, da consciência humana.
Nos primeiros jogos de tiro, nossos inimigos eram monstros, seres feios e asquerosos que ameaçavam a vida na Terra, e que, portanto, precisavam ser exterminados, até mesmo por uma questão de sobrevivência do personagem controlado. Mas, aí, os games foram evoluindo, e, em Wolfenstein 3D, tínhamos de combater seres humanos alemães, os nazistas. Ninguém questionou o elemento humano, afinal, os nazistas eram tão ameaçadores para os humanos quanto os aliens de Doom, mas algumas pessoas naquela época ainda se perguntavam se era saudável disparar em outras pessoas pelo videogame. Sempre fomos levados pelo mesmo motivo: era o que tinha de ser feito pelo jogo. Não tem muito o que questionar, se é isso que temos que fazer para fechar, vamos fazer.



Os jogos foram evoluindo, sempre tendo como adversários os inimigos conhecidos de guerra, como nazistas ou vietnamitas, e sempre havia um vídeo de explicação de porque tínhamos de matá-los, porque disseminar nosso ódio para cima deles. Mas os games já saíram deste ponto. Os jogos de hoje mal explicam quem são nossos inimigos, ou porque estamos indo matá-los a sangue frio. Às vezes, o personagem está aprisionado, e precisa escapar, portanto, trata-se de uma luta pela sobrevivência, mas, outras vezes, o personagem tem de invadir um hotel para matar terroristas, e acaba tendo de matar um monte de civis e seguranças do hotel no meio do caminho, como acontece em 007: World Is Not Enough. Muitos dos inimigos que aparecem nos games nem são nossos inimigos declarados, mas continuamos atirando neles. Seja matando cientistas em Syphon Filter ou matando os moradores de Atena em God of War, qualquer um que aparece em nosso caminho pode ser assassinado, contanto que isso não estrague a missão, é claro. Sem contar com jogos como Grand Theft Auto, Godfather e Mafia, em que temos missões cujo objetivo é destruir lojas de meros cidadãos e matar civis inocentes. Ao final da missão, já teremos matado 30, 40, 50 inimigos, e a pergunta é: eles precisavam mesmo morrer?
No jogo Call of Duty: Black Ops, por exemplo, em uma das missões, temos de invadir a casa de Fidel Castro e assassiná-lo. O jogo não apresenta exatamente nenhum motivo para fazer isso, mas é essa a missão, então teremos de cumprí-la. O próprio Fidel Castro não gostou desta história, o que é perfeitamente normal, afinal, poderia acontecer com qualquer um. No próximo Call of Duty, podemos ter de matar o Obama, a Dilma Rousseff, ou Hugo Chavez, e todos iriam achar perfeitamente normal.
A questão não é a banalidade da violência, mas o ponto em que as coisas chegaram. Nem precisamos mais de um motivo ou uma razão para lutarmos contra o inimigo, no mundo dos games, executando-os apenas por seguir ordens. No Estados Unidos, esse apelo pela violência ainda é explicado, mas e no Brasil? Não temos pena de morte aqui nesse país, apesar de os milhões de telespectadores de Tropa de Elite 2 concordarem que os bandidos merecem tomar uma bala na testa, mas isso se reflete aos videogames? Será que nós chegamos a um estágio em que nem precisamos mais refletir sobre o objetivo de um simples jogo, colocar os valores em cima da mesa e discutir?
Não digo que temos de parar de jogar esses jogos: estaria sendo hipócrita, pois eu adoro esses jogos todos mencionados acima. Maso que quero dizer é que as coisas poderiam ser mais bem explicadas e não tão apelativas. Já está na hora de exigirmos um pouco mais de jogos de ação e de tiro do que novas armas destrutivas e mais modos multiplayer: tudo isso poderia vir mesclado com uma boa história que fizesse realmente sentido, no final das contas, e depois da contagem de tantos corpos.
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